O novo Ashram minimalista

quarta-feira, 9 de abril de 2008

A Crónica que não escrevi: Eu e os Livros, IV

"E se eu lhe disser que ao fundo do corredor há um exemplar perdido da Bible Française de Saint-Jean d'Acre, um manuscrito do 3º quartel do século XIII?". Dou um pulo na cadeira, de súbito a promessa parece cumprir-se, a parada subiu estratosfericamente, que pode fazer um manuscrito desses fora de um museu, de uma biblioteca, de um espaço climatizado? De que meios dispõe ele? Manifestamente subestimei-o.
Curiosamente ele sorve o moscatel como se quisesse misturar a pulverização com o ar (como se fosse um carburador, penso).
"Sei que é um borgesiano dedicado", avança com um outro tom, mais descontraído e convicto, "e decerto não julga que o faria descer de Vila Pouca para sair daqui frustrado. Vamos então aos fac-similes, aos manuscritos, aos livros proibidos, inexistentes, inventados". O meu silêncio é de assentimento, e surpreendo-me a emborcar de um golo o restante do cálice, sinalizando a impaciência.
"Conhece o Necronomicon, de Lovecraft, o livro maldito, que todos julgavam inventado?", conheço a história, uma fantasia sugestiva, algo «spooky». "Pois é, retenhamos dela que a biblioteca – a de Schoelcher em Fort-de-France, a deste seu criado em Vilarinho das Paranheiras – pode ser também a entrada para os Infernos. Veremos se o livro é ou não é inventado".
Ele levanta-se, eu levanto-me, e avançamos os últimos passos até ao fundo do corredor.
...
(continua)

2 comentários:

Bic Laranja disse...

Já me apanhou.
Cumpts.

O Réprobo disse...

Bem, o próprio Lovecraft confessou a Bergier, por exemplo, que inventou o Livro dos Livros!
Que é que vem aí? O fantasma de John Dee?
Abraço

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