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À noite vejo a barafunda nos aeroportos, a caramelada desembarcada do Nordeste Brasileiro para intermináveis filas à espera da bagagem não-transviada, tudo uma confusão, tudo um sobressalto, uma espécie de hora de ponta na estrada de Sintra, agora com mais cheiro a bronzeador e com mais fitinhas e missangas, mas a mesma sensação de curral. De manhã, em revoadas de vento marinho ainda não concentrado na nortada, sento-me nas rochas cobertas de algas e remiro os pequenos aquários consentidos pela maré-baixa, uma espécie de pequenas galáxias multi-coloridas que espaçadamente fervilham no assalto de uma onda maior. Há muito a aprender ali, em especial sobre a riqueza de um universo vivo que, por uma vez, não é dádiva humana, que existe independentemente de nós, que é indiferente à nossa presença.
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As férias também servem (ou deviam servir) para isso, para sairmos da casa e da rotina, para mudarmos de cadência e de atenção, para deixarmos falar e colorir aquilo que a nossa distracção (que vaidosamente designamos por concentração) remete à escuridão e ao silêncio. O ruído da multidão, a confusão da gente, as filas no aeroporto, não são coisas necessariamente más, são expressões de vitalidade humana, reflexos e rastos do esforço que as pessoas fazem para serem felizes (e quem sou eu para julgá-las pelas opções que fazem); o mal está em que essas coisas praticamente absorvem em exclusivo dois bens escassíssimos, a atenção e o tempo, e deixam muito pouco de ambos para outras formas mais serenas e suaves de fruição da vida, aquelas formas nas quais o Sol doira sem literatura.
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