O novo Ashram minimalista

sábado, 23 de agosto de 2008

Um veto infeliz e inoportuno

Alguém terá soprado no ouvido do Reformado que ocupa o Palácio de Belém que o «no-fault» era o fim da macacada em matéria de divórcio - que era assim uma espécie de repúdio, daquele de que se ouvia falar em textos bíblicos e ainda se pratica nalgumas paragens mais selváticas do planeta. Mais, ter-lhe-ão dito que com o «no-fault» as pobres vítimas de pancadaria não conseguiriam arrancar a sua indemnizaçãozinha através da prova de culpa do energúmeno que as brutalizaria.
O pobre homem não tem culpa, porque não faz a mínima ideia do que é a «culpa» no divórcio. Já aqui disse o que pensava desse pretexto para o circo forense, para o sofrimento psicológico, para a dissolução da amizade e da confiança entre famílias - e sim, para a violência selvática - que é essa história da «culpa» no divórcio.
Alguém no seu perfeito juízo imagina que a «culpa» protege alguém? Alguém no seu perfeito juízo imagina que a «culpa» é um dissuasor do divórcio? Alguém com dois dedos de testa tem por justas soluções de parasitismo vitalício estabelecidas a favor do ex-cônjuge «inocente»? Haverá alguém tão imbecil que julgue que alguém fala verdade quando se trata de estabelecer a «culpa» num divórcio?
Pelos vistos, há alguém próximo do Reformado de Belém que pensa o impensável - alguém que não tem a mais remota ideia da tragédia inenarrável (e da injustiça vitalícia) em que pode converter-se um divórcio litigioso. Não é assim que se salva a instituição casamento, à custa de sofrimentos e mentiras. Este veto é uma imbecilidade total.

1 comentário:

Unknown disse...

Convenhamos. O divórcio é uma coisa tão íntima que é difícil ditar jurisprudência ex pulpito com a ilusão de poder ter razão, em vez de apenas... ter razões.
(Nem sempre) coisa de adultos, é uma espécie de plexus onde tudo se junta (ou devia juntar): ética vivencial, filosofia de vida, às vezes religião, mas sempre a verdade... Um saldo, enfim, entre o haver do compromisso inteligente e o dever do desbarato emocional.

Mas desculpará: - parasitismo é pretender equilibrar a balança a zero e considerar que a moeda de troca é toda a mesma e não passa pelo balcão de conversão das divisas.

Saberá muito bem que a ideia de culpa é o que é (e entre outras coisas normais é tb. objectivável). Por isso não vale a pena branquear as coisas, aproveitando a onda do politicamente correcto...
Saberá ainda - e tb. muito bem -, que os exageros da "desculpabilização" foram tamanhos que, por exemplo, o direito alemão recupera lentamente o conceito de culpa na disciplina da anulação do casamento, com consequências úteis no plano possível: o patrimonial. Precisamente! Custa, mas é justíssimo.
Não em nome do pai, mas em nome dos filhos, esse produto perene do 'antes não tivesse sido', por acaso (?) sempre invariavelmente a cargo de quem não sofreu as epifanias hormonais da meia idade... já que deste 'lado' se tornariam excessiavamente 'encombrants'.

Como em tudo na vida e no direito, o Estado só se mete na vida das pessoas para apurar esse saldo quando os próprios protagonistas não estão à altura de resolver essas contas privadas como gente de bem.
Não há negócio jurídico em Portugal em que a boa fé esteja tão desprotegida como no casamento.

PS- Neste caso não comento para defender o PR...


Laura

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