O novo Ashram minimalista

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Courbet e a ladeira escorregadia que conduz… a Himmler… via Barão Hatvany

Estava à espera dos gastos argumentos da ladeira escorregadia, confesso: estou habituado a lidar com eles noutros domínios.
Aqui, no «caso Courbet», revestem a forma: ou deixamos a «expressão artística» ter irrestrito curso, ou caímos na censura, tudo é reprimido irrestritamente, tudo fica ameaçado… e lá ao longe, no horizonte, começam a assomar as esperadas silhuetas de Himmler, talvez mesmo de Heydrich, e tutti quanti.
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(Um parêntesis erudito: "L'Origine du Monde" e "Femme Nue Couchée" andaram na mira de nazis e soviéticos durante a Guerra, e a custo o Barão Ferenc Hatvany, um judeu húngaro – uma dupla qualidade ameaçadíssima à época –, conseguiu conservar a primeira, tendo perdido a segunda. Parece portanto – suprema ironia – que os maiores censores do século XX eram muito apreciadores de Courbet).
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Voltando à ideia de que a «arte» é algo de sagrado e intocável (coisa que autoriza o sobranceiro parasitismo no qual os artistas são «artistas»), a ladeira escorregadia é um não muito subtil apelo à nossa solidariedade para com o «artista incompreendido», uma invenção romântica (com raríssimas excepções, os artistas que ficaram para a história foram ostensivamente, enjoativamente, apaparicados pelos poderosos), agitando o «papão» da censura, a putativa vitória das «trevas» contra os «iluminados».
O argumento é facilmente reversível: e se um pintor resolver exibir uma série de quadros glorificando a sodomização de crianças? Estão a ver outra ladeira, não é assim? O argumento não prova nada, portanto; deixemo-lo.
No fim, tudo se resume à questão da responsabilidade do homem comum e da irresponsabilização dos «seres eleitos»: o único ponto relevante em tudo isto.
Suponhamos que um restaurante de Braga fornece sistematicamente comida estragada à clientela, e que por isso as autoridades sanitárias decidem encerrá-lo: significa que ficam em risco de encerramento todos os demais restaurantes de Braga? Significa isso que, para que um tal risco não surja no horizointe, jamais se deve encerrar um restaurante, faça ele o que fizer?
Há por aí uma rapaziada «iluminada» que, se em vez de «restaurante» tivéssemos escrito «artista», responderia sem hesitar que tudo fica em risco (acudam, que lá vem a censura!) e que por isso nada deve ser reprimido ou proibido (a populaça que aguente as intoxicações).
Sobranceria parasitária dos «artistas», ingenuidade dos que crêem na «liberdade de expressão» como antigamente se acreditava nas mais extravagantes atribuições às divindades. A fileira dos papalvos nunca pára de crescer: deve ser isso que subentendem muitos dos que sustentam que toda a arte é, ou deve ser, imorredoira.

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