O novo Ashram minimalista

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Conversas à Direita: Bobbys, Tarecos, e o Menino Pompeu

Numa recente tentativa de conversa «à direita» percebi que no meio pontifica agora o estilo «cozinha americana», vulgo «open space».
Está a gente à conversa no salão e, à falta de divisória, ensurdece-nos o alvoroço na copa: ele é o arear dos tachos que é suspenso por alarido sopeiro, ele é terrinas deitadas ao chão, ele é o rosnar de Bobbys e o bufar de Tarecos, todos em guinchinhos de zelo na defesa dos donos – mesmo quando os donos dispensam essa defesa.
A certa altura a conversa decente deixa de fazer significado (e deixou), e fica apenas o ulular das harpias que cheiram a refogado.
Para rematar os acontecimentos, a última palavra cabe sempre ao inolvidável menino Pompeu, que nos persegue até ao hall com a língua de fora, e que, fazendo caretas, hiperventilando e mijando os calções, vai trinando: "perdeste! nhanhanha! perdeste! nhanhanha!".
Que delícia! O Pompeu é aquele enfezado da nossa turma dos 10 anos que alinhava sempre com os matulões de 15 quando eles apareciam com rolamentos de esferas a destruírem os nossos abafadores e olhos-de-boi, e vinha com o "nhanhanha! perdeste!", julgando vital o resultado no jogo do berlinde.
Pompeu, que inveja dos teus eternos 10 anos! Toma lá 50 paus e vai comprar uma quarta de caramelos, e não deixes que os matulões, sempre uns ingratos, te roubem os 50 paus para comprarem tabaco. Vai, pá! O Tio Jansenista perdeu! Estás realizado! E acalma-te, pá, não hiperventiles e não sujes os calções! Adeus, Pompeu!
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(Adeus, pá, não leias a seguir)
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É cruel revelar às crianças que a vida não consente realmente vencedores e perdedores, em especial quando se trata da troca de opiniões, por vigorosa que essa troca seja. Mesmo no berlinde o jogo é mais importante do que o resultado, e não percebê-lo é contribuir para a única derrota certa, a derrota colectiva que consiste na perda de tempo. Pobre Pompeu, tão feliz na sua inocência! Oxalá não venha a saber que os matulões lhe cobiçam o dinheiro e possa comer os caramelos e possa continuar a dividir o mundo em categorias binárias e não perceba nunca a figura que faz. Não é por mim que vai ficar a sabê-lo, insisto que seria cruel.
Os donos da casa gostam dele, e dos bobbys e dos tarecos, e nesse alarido sopeiro sentem-se amparados, confortados, aplaudidos, venerados, liderantes. Cada um é como é; por mim, já dispensei há muito serviçais, e reina a serenidade quando há visitas.

1 comentário:

Unknown disse...

Impossível não rir:)

Mas desculpará que eu não concorde com a sua generalização ao (soit disant) "meio"...
Porque aquilo a que se chamava "educação" (condição ou estado resultante de um investimento persistente, sistemático e inteligente, por parte dos adultos, nos hábitos comportamentais dos herdeiros...)ainda se encontra por aí, mesmo em modelos "bicéfalos" de família (=high standard working parents)!
Dá muito trabalho, ah, pois dá...

Mas não deixa de ter razão, tendencialmente. O contributo que damos hoje em dia para a dita "educação" está quase reduzida à monumental factura do colégio privado!
No fundo, é uma filosofia de responsabilidades idêntica ao modelo conceptual decorativo dos tempos que correm: minimalista. :)
E mais, com efeito similar: um eco insuportável!!! Dada a inexistência de barreiras, arquitectónicas ou mentais, físicas ou psicológicas...

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