A conversa descamba, parece-me, na maledicência e no mexerico, e eu, que normalmente sou um ávido praticante, empenho-me na leitura das mais pequeninas letrinhas no rótulo das garrafas, e fico a cismar naquilo que, do canto do olho, julgo ser um clarão vindo do lado do mar. Como, no meu alheamento, me escapa uma pergunta que me era dirigida, respondo com um riso pesado, que passa por um subtil «no comments».
Na mesa ao lado um casal gesticula com os talheres enquanto espera ser servido, e depois de chegar a comida ela continua a acariciá-lo com a mão, incansavelmente «aux petits soins» (imagina-se debaixo da mesa o jogo de pedaleira, a fazer inveja a um organista).
Chega o momento, com a sobremesa, de contar algumas histórias não-maledicentes, logo quando a custo tinha finalmente alinhavado uma bem canalha. Os «bright young things» revelam a sua impaciência com a «rentrée» (nome detestável), cheios de projectos e sonhos. Eu também os tenho, mas estão a hibernar. Limão confitado em cama de goiabada com espuma de quê? Devem estar a brincar, este derradeiro «el bullismo» sacode-me da letargia e quase me motiva a um protesto, mas por decoro invoco o fígado (que nunca esteve tão bom) e privo-me de sobremesa.
A infinita bondade dos meus convivas evita que surjam cigarros, cigarrilhas e charutos a estragar, na 25ª hora, uma refeição que se ajustou perfeitamente ao meu bloqueio semi-letárgico (talvez a alusão ao fígado tenha sido oportuna).
Sinto-me agradecido, e impelido a contar-lhes uma anedota que li um dia antes de vir para a praia, na Correspondência Nancy Mitford / Evelyn Waugh: num baile muito animado no rescaldo da Guerra, em 1945 ou 46, um dos participantes, maravilhado com tanta cor e tanta liberdade, observa para uma senhora presente "foi por isto que nós lutámos!", ao que ela responde, surpreendida: "porquê, são todos polacos?".
Riram com gosto, e eu lá venci a insegurança – mesmo a tempo, que o mês acaba amanhã.
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