O novo Ashram minimalista

domingo, 5 de junho de 2011

One more for the road


Ouvi na rádio, vinha a caminho de Lisboa, entorpecido da auto-estrada e de preocupações diluídas no mais impecável smooth jazz da rádio portuguesa. O Rádio Blogue ia acabar! Ia acabar? Percebi que era apenas a respectiva leitura às tardes de sexta-feira; mas depois, lendo no próprio site, vi que era coisa muito mais radical, definitiva.
Ainda não conheci pessoalmente a Carla (isso só sucederá para o mês, se entretanto não me fizer substituir pelo meu primo), mas os desafios que ela lançava neste Rádio Blogue eram uma excelente base para discussão civilizada, com elegância mas sem reverência, para a consolidação de uma espécie de "confiança intelectual", uma quase-"cumplicidade virtual" que pode bem passar por ser um sucedâneo cibernético da amizade.
Lamento que a rotina nem sempre me tenha permitido sequer ler o trecho semanal, e menos ainda corresponder a todas as interpelações intelectuais. Eram sempre motes a merecer glosa.
Paciência, o diálogo continuará, deo juvante, por outras paragens, e estou certo de que a mesma chama intelectual da autora alumiará outras veredas.
As coisas que valem a pena são as que estão vivas; e essas têm um momento de geração e um de corrupção, têm a beleza do que é efémero e a abstracta dignidade daquilo que só na memória perdura incorrupto. Imagino os prodígios de equilíbrio que o Rádio Blogue exigiu, expondo-se tão abertamente num meio muito menos controlado do que aquele que é o dos blogues sem rádio. Eu não teria sido capaz, mas por isso mesmo é que nunca tive, não tenho nem terei a consagração blogosférica da Carla.
Aristóteles, o conceptualizador desse movimento de geração e corrupção, entendia que alguma coisa perduraria, um grande elo unificador das percepções transitórias desse movimento perpétuo: chamou-lhe "substância", o que fica quando tudo passa. É, Carla, o Rádio Blogue teve substância, ou, se quisermos o equivalente culinário e farta-brutos, foi coisa "de sustância", um repasto gratificante; efémero como todos os repastos, inesquecível como os bons repastos.

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