Há uns dias uns bloguistas acusavam outros de representarem a nova PVDE.
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Lembrei-me imediatamente do meu avô materno, que foi da PVDE, um santo homem de que conservo as mais doces memórias.
Fora combatente na Flandres com o CEP (aos 18 anos!) e ao regressar enveredou pela carreira das armas.
As incursões monárquicas tomaram em Chaves, a sua terra, tonalidades de guerra civil, reforçando nele as convicções republicanas (as clivagens e ódios em torno desses episódios perduraram muitos decénios, e ainda há hoje localmente historiadores "revisionistas", a remexerem nesse capital de ressentimento). Depois seguiu-se a bandalheira que é sabida, e que nem poupou, em sinistras vendettas alfacinhas, a vida a alguns dos políticos transmontanos.
Imagino o júbilo com que o meu avô aderiu ao movimento do 28 de Maio – um movimento que não apenas se apresentava como regenerador e redentor, visando pôr termo à bandalheira "democrática" (sem questionar o ideário republicano), como ainda era liderado por camaradas de armas, "veteranos da Flandres" como ele.
Não recusou ao Estado Novo nenhuma das tarefas de que o incumbiram, aqui e no Ultramar. Viveu honradamente; não enriqueceu; morreu no amor dos seus e no temor a Deus, que o poupou, por quatro anos, de assistir ao 25A, o desmoronamento de tudo em que ele acreditava, de tudo aquilo que ele modestamente ajudara a edificar.
Lembro-me de um primo meu, herói de guerra, ter saído directamente da cerimónia em que recebera a Torre e Espada para casa do meu avô, a receber a bênção dele.
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Os anos da PVDE consistiram na patrulha da fronteira transmontana, numa época especialmente melindrosa dada a situação em Espanha e dada a carência económica nos dois países. Não sei que género de violências anti-democráticas o meu avô terá cometido, se é que as cometeu; algumas chibatadas e coronhadas em contrabandistas mais ousados, certamente; creio que nada com que encher de esqueletos o armário familiar. Sei que eram patrulhas a cavalo que duravam semanas, e que companheiros de jornada evocavam, muitos anos depois, como à noite se retemperavam, nas aldeias em que se aboletavam, com opíparas pratadas de batatas cozidas (pouco mais havia nesses tempos difíceis).
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Era muito mais patriota do que eu alguma vez serei, e nunca colocou em dúvida que travava o bom combate, que agia pelo bem comum, que servia desígnios históricos colocando as suas forças ao serviço da Lei, e contra aqueles que, no seu espírito, queriam por palavras ou actos (voltar a) comprometer o futuro da Nação. Nunca teria percebido, estou certo, este distanciamento cínico com que um neto dele despreza, ou é indiferente a, quase tudo o que é português (com honrosas excepções). Talvez só me perdoasse tal degeneração aparente como reacção ao rescaldo do 25A.
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Foi da PVDE.
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De vez em quando buscamos no sedimento do nosso impudor congénito alguns pedregulhos para arremessarmos, e esse da culpa colectiva e retroactiva por pertença a uma organização policial, uma monstruosidade jurídica com que o revanchismo abrilino ornamentou a própria Constituição, é decerto o mais acerado e fétido dos pedregulhos – é uma vergonha jurídica e moral.
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Um dia um Daniel Goldhagen qualquer explicará que essa demonização da PVDE, e da PIDE/DGS, não passa de uma ínvia forma de exoneração colectiva, por atribuição "concentrada" de males que não podiam senão residir em todos nós, bem arreigados em "familiares do Santo Ofício" que nunca deixámos de ser, por mais que, terminado o "passa-culpas", protestemos a nossa devoção à liberdade e à tolerância política e cívica.
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Um dia alguém, sem pré-aviso, esgravatará mais fundo do que a lia da memória lusa e soerguerá o espelho dessa nossa identidade "bufa" (em mais de um sentido). A imagem será horrível.
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