O novo Ashram minimalista

terça-feira, 9 de março de 2010

Noite curta, café da manhã, e aqui vamos!



Todo mundo ouvia falar muito de João Gilberto. Diziam que era um cara maluco, que já havia sido internado, vivia de cabelo enorme, barbado e que, como um vampiro, só saía à noite.
Certo dia, chegou à casa do Ronaldo Bôscoli. Não era nada do que diziam as más línguas.
Cabelo cortado, barba feita, sapato engraxado e, claro, um violão debaixo do braço. Tocou um violão fantástico que deixou todo mundo boquiaberto e explicou que tinha brigado com o Tito Madi, não tendo para onde ir. Já era madrugada quando João, convidado pelo Bôscoli, mudou-se para o pequeno quarto-e-sala do Edifício Haiti onde já moravam, além do Bôscoli, Mièle e um empregado chamado Chico. Cinco "artistas" num quarto-e-sala.
Era um sujeito de hábitos muito estranhos. Ficava horas ao telefone, horas no banheiro, para desespero dos outros moradores. Dormia vestido, com uma gravata tapando os olhos. Ficava, como um morto, em decúbito dorsal. Sempre muito limpo, muito asseado.
Havia um sistema para compras de mantimentos para a casa em que todos cooperavam. Só que o João Gilberto só comprava o que gostava: Tangerina!
Ia pra rua de madrugada, passava na feira e comprava quilos de tangerina. Chegava por volta das seis horas e acordava todo mundo, cantando as músicas do dono da casa, Ronaldo Bôscoli. Aprendeu "Lobo Bobo" (que o Bôscoli fez para a Nara) e "Saudade fez um Samba", com acordes magníficos, deslumbrando a todos.
Certo dia disse ao Ronaldo (a quem ele chamava de "Ronga"):
- "Que suéter bonito, Ronga! Vocês cariocas tem bom gosto! Me empresta?".
O coitado do Bôscoli emprestou o lindo suéter que ficou pra sempre com o "cara-de-pau".
Quem quiser ver, compre o primeiro LP que gravou: "Chega de Saudade". O suéter está lá.

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