O novo Ashram minimalista

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Sobre a onda de crime violento


A uma crónica de Charlotte sobre a «onda» do crime violento, ocorreu-me acrescentar:
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No meu espírito, há três formas de organização básica de uma comunidade: a fraterna (assente no amor), a lockeana/coaseana (assente na razão e na conveniência) e a hobbesiana (assente no medo).
Os utopistas (ditos «homens de boa vontade») acreditam que a primeira é possível. Os reformistas insistem num esforço pedagógico para que surja a segunda. Os realistas (e os desencantados e os cínicos) julgam possível somente a terceira.
Acho que em qualquer comunidade organizada coexistem os três elementos, o primeiro na forma como idealizamos os nossos pontos focais, os outros dois no modo como começamos a confiar, ou deixamos de confiar, na boa vontade dos outros.
Sem cairmos na neurose que se alarma com a notícia do último minuto, há que admitir que a vertente lockeana/coaseana, que todos temos procurado construir através de um esforço civilizacional perenemente exposto à contingência e à intolerância – talvez o legado civilizacional mais perene dos últimos séculos, mas também o mais frágil e incompreendido –, cedeu uns pontos à vertente hobbesiana.
É sempre com uma pontinha de angústia que assistimos a estas oscilações, de receio de que um dia uma delas resvale para lá do «tipping point» que desencadeia a avalanche hobbesiana e torna inevitável, ou a anomia da guerra civil, ou a ferocidade do Leviatão.
Era bom que a nossa coexistência pactuada, o plano ascendente lockeano/coaseano, não sofresse estes solavancos, e deixasse um espaço irénico para os sonhos fraternos do homens de boa vontade. Em pleno sobressalto negativo isto soa mais remoto ainda.
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