Eu sei que a vida tem que fazer-se com todas as cores, com todas as tonalidades e cambiantes de luz e sombra – e que aquele que quer afastar o cálice do risco e da tragédia arrisca a mutilação de uma vida que ficará alienada, não-examinada, eticamente indigna. Mas quando na lia do cálice aparece o sofrimento de crianças, então apetece renegar tudo e fugir. Às vezes é isso que leio em Platão, essa vontade de fuga para um mundo de erradicação permanente do sofrimento, um mundo susceptível de fazer sentido a qualquer preço – mas depois percebo o esterilizador que seria recusarmos a fragilidade daquilo que nos alenta a prosseguirmos, porque com essa recusa pura e simplesmente não prosseguiríamos: uma vida ética não pode fazer-se de luz sem sombra, não há ganho onde não houver ocasião de perda, e não há sentido nenhum que possamos impôr à vida como sua condição prévia. Mas porquê deixar as crianças expostas à tragédia? Porquê perdê-las? Hoje a tragédia bateu à porta de amigos, e eu não consigo descortinar qualquer moralidade, ou elemento redentor, em tudo isso. Só me apetece fugir.
O novo Ashram minimalista
terça-feira, 2 de outubro de 2007
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