A segunda acusação grave do fim de semana aparece nas Memórias de J.H. Saraiva, e respeita à «venda de vistos» por Aristides de Sousa Mendes, numa versão atribuída ao Prof. Leite Pinto e com livre curso nas Necessidades. Já em tempos confessei as minhas dúvidas sobre os factos pertinentes ao caso, e lamentei a «pedra sobre o assunto», uma espécie de «Vichy à portuguesa» (quem é que ganha com isso? a memória dos «pides» que alegadamente terão participado?).
Em todo o caso um facto é insofismável, vidas foram salvas, e em condições terríveis, e por isso a minha admiração pelo gesto não fica comprometida – porque não se reclamava aquela heroicidade que normalmente nos comove, é certo, mas apenas a eficácia muito pragmática no salvamento de vidas que queriam viver, sendo que algumas foram salvas.
Era preferível que a motivação mercenária não tivesse existido – mas pergunto-me se a cobardia da maior parte dos nossos diplomatas da época não foi menos mercenária, todos com medo de perderem os seus postos e as suas benesses através de um gesto «impensado» ou menos servil.
Em todo o caso um facto é insofismável, vidas foram salvas, e em condições terríveis, e por isso a minha admiração pelo gesto não fica comprometida – porque não se reclamava aquela heroicidade que normalmente nos comove, é certo, mas apenas a eficácia muito pragmática no salvamento de vidas que queriam viver, sendo que algumas foram salvas.
Era preferível que a motivação mercenária não tivesse existido – mas pergunto-me se a cobardia da maior parte dos nossos diplomatas da época não foi menos mercenária, todos com medo de perderem os seus postos e as suas benesses através de um gesto «impensado» ou menos servil.
Tudo, no fim, parece resumir-se a isto: um mercenarismo que salvou vidas, comparado com a cobardia inerte daqueles que sabiam o que estava em jogo e se abstiveram do dever positivo de salvar. Sousa Mendes ficaria muito mal no retrato se tivesse havido um só diplomata português a notabilizar-se no salvamento de refugiados – gratuitamente, por simples imperativo moral, sem cálculo, sem prudência, a troco de nada. Não houve um só, e por isso ele permanece, no meu critério, um degrau acima do extenso batalhão dos cobardes que julgavam «salvar a pele» olhando para o lado.
9 comentários:
Excelente post! Retirar a aura romântica dos factos sem os desvalorizar, já que os resultados são os mesmos. No entanto, pergunto-me se Aristides teria uma tabela de preços e se esta seria fixa independentemente dos rendimentos dos "clientes". Consideraria ele, de acordo com um mito muito vulgar no Ocidente, que judeu é sinónimo de rico?
Oops, lá enviei a mensagem em triplicado. As minhas desculpas.
*************
Está mais uma vez provado que o Jansenista é especialista em apagamentos porque não tem argumentos. Seja. Está no seu direito de lingrinhas de intelecto.
Mas permita-me ao menos colocar-lhe uma dúvida, a juntar à superior subtileza de José Pedro Ribeiro, que possivelmente lhe passará ao lado: é ou não verdade que o Aristides fazia desconto a crianças, pobres e reformados?
E não acha que os pides que tudo arriscaram e sacrificaram em 1940 «para salvar os judeus» -- anos antes da conferência de Wansee, da estrela e das deportações -- também merecem, já não digo campanhas da Maria Barroso em prol de mais «casas da tolerância», mas ao menos uns arbustozitos no Yad Vashem, ao lado da sequóia do gigante moral Aristides?
Pedro Botelho: agradeço-lhe os cumprimentos, mas são imerecidos. Nenhuma palavra do meu comentário anterior reflecte qualquer forma de subtileza, superior ou inferior. O meu propósito não é colocar achas numa fogueira que deixou de ter combustível desde que os aliados invadiram os campos de extermínio alemães. Apenas tentei obter esclarecimentos adicionais do prezado Autor deste blog e, já agora, confesso que a resposta esperada era a de que Aristides apenas cobrava aos ricos. Conheci pessoas assim. Eram da mesma época, ou pouco posterior, e tinham uma concepção romântica da vida que os levou a enfrentar terríveis infortúnios. Médicos e advogados como já não se fazem hoje em dia.
Não pretendo julgar Aristides. É difícil aos pequenos julgar os grandes, no entanto, muitos andam por aí a colocar-se em bicos de pés, talvez devido à vida enfadonha e medíocre que levam (todos conhecemos Galileu mas os nomes dos que o condenaram nunca saíram da obscuridade). Os verdadeiros criminosos há muito foram julgados e os hospícios estão cheios de gente que se recusa a aceitar a realidade.
Cumprimentos.
José Pedro Ribeiro
(Apaguei para corrigir uma pequena gaffe).
Conheci informadores da PIDE que ganhavam dinheiro a passar pela fronteira jovens de origens humildes que preferiram optar por ajudar as suas famílias trabalhando no Estrangeiro, a serem forçados a embarcar para a distante guerra de uma África, da qual nada sabiam e que pouco ou nada lhes interessava. Acredito que sem a conivência da PIDE, Aristides não tivesse podido fazer o que fez. E esta conivência pagava-se.
«e, já agora, confesso que a resposta esperada era a de que Aristides apenas cobrava aos ricos.»
«Cobrava»? Bom, cada um escolhe o vocabulário que prefere e espera enquanto quiser...
Por mim prefiro, se isso não o incomoda, continuar a classificar as suas perguntas como «subtis». Retiro no entanto a «superioridade», se ela o incomoda, já que me garante que a subtileza é puramente acidental.
hermano saraiva lançou um falso rumor contra Aristides S. Mendes esse é que é o facto. Está mais que provado pelos especialistas judeus do holocausto (Yad Vashem) que Aristides S. Mendes não cobrou um centavo a ninguém. Foi um gesto puro de grande altruismo e não foram só judeus que salvou. è um insulto á memória de A Sousa Mendes pensar que havia "tabela de preços".
Enviar um comentário